Há tempos deixei de abastecer este Blog, mesmo assim ele continua ativo, servindo de inspiração para muitos professores. Se você chegou até aqui, saiba que os conteúdos aqui postados são aulas que preparei para mim. Eu não quis guardar minhas experiências, pois sei que a maioria dos professores não têm muito tempo. Aproveite. Blog criado em 18/09/2006

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17 de janeiro de 2008

O Amigo da Onça


Não era muito comum eu me recordar de minha infância ou adolescência, mas depois que comecei a publicar este blog, refletindo sobre o que escrever, relembrei vários fatos marcantes daquela época. Talvez isto seja uma manifestação da terceira idade. Dizem que as pessoas quanto mais velhas, mais se recordam do passado. Pode ser que isso esteja acontecendo comigo.
Passei minha infância morando num sítio. Naquela época, as pessoas da zona rural não desfrutavam do conforto como hoje. Tudo era muito difícil. Só havia energia elétrica na cidade e televisão apenas nas capitais. A água era puxada de um poço de dezoito metros de profundidade, e o balde era grande para render mais. Era preciso puxar água para tudo: cozinhar, tomar banho, lavar louças e roupas, matar a sede dos animais, aguar a horta... A água do banho era aquecida e posta num chuveiro de no máximo quinze litros, que era erguido com uma corda. E era necessário economizar a água para não faltar água na hora de enxaguar os cabelos. Tínhamos que descascar o milho para tratar dos porcos. O fogão era a lenha, portanto era necessário rachar a lenha para cozinhar e para o forno a lenha onde se assava o pão.
Tínhamos um rádio que funcionava a bateria. À proporção que a bateria descarregava, o rádio emitia os sons cada vez mais baixo, a ponto de minha mãe ficar com o ouvido colado nele para ouvir, escondida de meu pai, a novela "O direito de nascer" (Audio) . Também era preciso economizar a bateria para meu pai ouvir “A Hora do Brasil”, o “Repórter Esso”, programas de música sertaneja e de humor. Quando chovia, se não corrêssemos desligar a chave que ligava o rádio a sua antena externa, o fusível queimava com o primeiro relâmpago. Isto era uma tragédia, ouvir rádio de novo só depois que meu fosse à cidade e mandasse consertá-lo. 



O rádio era o único meio de comunicação que entrava em nossa casa, exceto os jornais nos quais vinham embrulhadas as compras feitas na venda da Água dos Alves ou de um armazém de Munhoz de Melo. Alguns eram guardados para um eventual embrulho, o restante era levado para o mictório, onde antes de serem usados, serviam para a leitura.
Livros infantis? Recordo-me de um. Narrava a história de João e Maria, só que eu o despachei pelo correio para ser lido num programa de rádio para crianças. Aguardei muitas semanas para ouvir meu livro predileto ser lido no ar, mas foi em vão, porque isso nunca aconteceu. Aí veio o arrependimento e a dor da perda.


Quando eu já tinha uns doze ou treze anos, ganhei de uma tia, que morava na Capital, uma coleção de revistas em quadrinhos usadas. Chama-se “Série Sagrada”. Eram revistas religiosas. Nelas eu li e reli diversas vezes a biografia de muitos santos da Igreja Católica. Às vezes eu ficava apenas contemplando as gravuras em preto e branco.




Você pode até pensar que eu fui uma péssima aluna no curso primário, pois eu não tinha recursos que aumentassem meus conhecimentos. Engano. Quando fui cursar a primeira série eu já sabia ler. Meu pai, com o conhecimento adquirido em apenas dois meses de estudo e minha mãe com estudo até a terceira série primária, ensinaram-me a ler numa cartilha praticamente sem gravuras, chama-se “Cartilha da Infância”. Quando entrei na escola, a cartilha “Caminho Suave” foi fácil, eu já sabia ler e escrever meu nome.

Enquanto criança e adolescente, poucas revistas chegaram até minhas mãos: as que ganhei de minha tia distante e outras raras, compradas por minha mãe. A que mais me marcou foi a revista “O Cruzeiro”, na qual eram publicadas noticias sobre artistas da época, sobre os principais acontecimentos políticos brasileiros e fatos internacionais. Esta, trazia uma página com um desenho que eu achava engraçado e me divertia: O Amigo da Onça.


Os anos foram passando, a revista O Cruzeiro, que era vendida de Norte a Sul do Brasil, principalmente pelo sucesso do Amigo da Onça, deixou de ser publicada, e o Amigo da Onça ficou adormecido dentro de mim. Remexendo no baú das lembranças eu o encontrei.
Terezinha Bordignon

Amigo da Onça


Este personagem foi criado pelo cartunista pernambucano Péricles Andrade Maranhão em 23 de outubro de 1943. A revista O Cruzeiro o publicou por mais de vinte anos. Ele tinha as características da malandragem carioca: cabelo penteado para trás a base de gumex, sapatos sempre lustrosos, terno branco, um bigodinho fino. Sarcástico e irônico, sempre colocava as pessoas em situações difíceis. Sua grande popularidade devia-se principalmente de ser entendido ao humor inteligente que captava o cotidiano da época. Recebeu este nome de Leon Godinho em virtude de uma anedota da época e por ter a característica de um amigo falso e hipócrita.

Dois caçadores conversavam em seu acampamento:
- O que você faria se estivesse agora na selva e uma onça aparecesse na sua frente.
­- Ora, eu dava um tiro nela.
- Mas se você não tivesse nenhuma arma de fogo?
- Bom, então eu matava ela com um facão.
- E se você estivesse sem facão?
- Apanhava um pedaço de pau.
- E se não tivesse nenhum pedaço de pau?
- Subiria na árvore mais próxima!
- E se não tivesse nenhuma árvore?
- Sairia correndo.
- E se você estivesse paralisado de medo?
Então, o outro, já irritado, retruca:
- Mas, afinal, você é meu amigo ou amigo da onça?
Péricles teve uma vida de solidão e boemia. Era conhecido como o criador do Amigo da Onça. Seu personagem era mais importante que ele. Morreu tragicamente em 31 de dezembro de 1961. Fechou as portas do seu apartamento e ligou o gás. Ainda deixou um bilhete na porta do escritório: “Não risquem fósforos!”

Péricles teve uma vida de solidão e boemia. Era conhecido como o criador do Amigo da Onça. Seu personagem era mais importante que ele. Morreu tragicamente em 31 de dezembro de 1961. Fechou as portas do seu apartamento e ligou o gás. Ainda deixou um bilhete na porta do escritório: “Não risquem fósforos!”
Após sua morte, quem continuou desenhando sua página foi o cartunista Carlos Estevão.
Fonte de Pesquisa:

2 comentários:

  1. Olá Terezinha,

    Adorei seus blogs (visitei os outros)! (Cheguei por via do Acaso e de um amigo, o Cleber Baleeiro.)

    Sua história de vida é linda. Lembra minha infância no interior de Minas. Também aprendi muito com a história que dá origem à expressão "amigo da onça".

    As músicas são maravilhosas. Principalmente Badinerie (From Orchestral Suite No. 2 In B Minor), de Bach.

    Enfim... Identifiquei-me bastante com este lugar.

    Desejo-lhe uma semana de muita paz!

    Deixo-lhe um abraço fraterno.

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  2. Quem diria q alguém que na infância aprendeu a ler em cartilha com raros atrativos, se daria tão bem com as palavras...
    bjos

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A humanidade é um oceano. Se algumas gotas estão sujas, isso não significa que ele todo ficará sujo. (Mahatma Gandhi)